Os
planejadores militares do Pentágono estão agudamente conscientes do papel
central da propaganda de guerra. Engendrada pelo Pentágono, pelo Departamento
de Estado e pela CIA, já foi lançada uma Campanha de Medo e Desinformação (CMD)
[Fear and Disinformation Campaign (FDC)]. A grosseira distorção da verdade e a
sistemática manipulação de todas as fontes de informação constituem uma
parte integral do planejamento de guerra. Em consequência do 11 de Setembro, o
Secretário da Defesa Donald Rumsfeld criou o Gabinete de Influência Estratégia
[Office of Strategic Influence (OSI)], ou Gabinete de Desinformação"
["Office of Desinformation"] como foi rotulado pelos seus críticos:
"O
Departamento da Defesa disse que precisavam fazer isto, e estavam realmente a
caminho de plantar estórias falsas em países estrangeiros - num esforço para
influenciar a opinião pública por todo o Mundo. [1]
E,
de repente, o OSI foi formalmente desfeito após pressões políticas e
"perturbadoras" estórias na mídia de que "a sua finalidade era
mentir deliberadamente a fim de promover interesses americanos". [2] "Rumsfeld
recuou e disse que isto é embaraçoso" [3] Mas apesar dessa aparente meia
volta, as orwellianas campanhas de desinformação do Pentágono continuam
funcionalmente intactas: "O Secretário da Defesa não está sendo
particularmente honesto quanto a isso. A desinformação em propaganda militar
é parte da guerra". [4]
Rumsfeld
confirmou posteriormente, numa entrevista à imprensa, que apesar de o OSI não
mais existir com esse nome, as "funções propostas para o Gabinete estão
sendo executadas" [5] (As palavras precisas de Rumsfeld podem ser
consultadas em http://www.fas.org/sgp/news/2002/
11/dod111802.html).
Um
certo número de agências governamentais e unidades de inteligência - com ligações
ao Pentágono - estão envolvidas em várias componentes da campanha de
propaganda. As realidades são viradas de cabeça para baixo. Atos de guerra são
apregoados como "intervenções humanitárias" destinados a uma
"mudança de regime" e à "restauração da democracia". A
ocupação militar e o massacre de civis são apresentados como "manutenção
da paz". A abolição de liberdades civis - no contexto da assim chamada
"legislação anti-terrorista" - é retratada como um meio para
proporcionar "segurança interna" e promover liberdades civis. E
subjacentes a estas realidades manipuladas, declarações sobre "Ussama ben
Ladin" e "Armas de destruição em massa", que circulam
abundantemente nas cadeias de notícias, são apresentadas como a base para um
entendimento dos acontecimentos mundiais.
Nos
críticos "cenários de planejamento" que conduzem a uma invasão do
Iraque, a distorção da opinião pública interna e por todo o Mundo é uma
parte integral da agenda guerreira. A propaganda de guerra é efetuada em todas
as etapas: antes, durante a operação militar e também após os seus cruéis
resultados. A propaganda de guerra serve para esconder as causas reais e as
consequências da guerra.
Poucos
meses depois de o OSI ter sido dispersado em meio a controvérsias (Fevereiro de
2002), The New York Times confirmou que a campanha de desinformação estava
sendo executada com toda a força e que o Pentágono estava:
".considerando
emitir uma diretiva secreta aos militares americanos para conduzirem operações
cobertas destinadas a influenciar a opinião pública e decisores políticos em
países amigos e neutros... A proposta disparou uma encarniçada batalha em toda
a administração Bush sobre se os militares deveriam executar missões secretas
de propaganda em países amigos como a Alemanha... A luta, disse um responsável
do Pentágono, é sobre 'as comunicações estratégicas para o nosso país, a
mensagem que queremos enviar para influência a longo prazo, e como fazermos
isso... 'Temos os meios e as capacidades e o treinamento para penetrar países
amigos e neutros e influenciar a opinião pública. Podíamos fazer isso e
escapar. Isso não significava que o faríamos'. [6]
Fabricando
a verdade
Para
sustentar a agenda de guerra, essas "realidades fabricadas",
canalizadas numa base diária para dentro das cadeia de notícias devem
tornar-se verdades indeléveis, as quais tornam-se parte de um vasto consenso
político e da mídias. A esse respeito, a mídia corporativa - embora atuando
independentemente do aparelho de inteligência militar - é um instrumento dessa
evolução totalitária do regime.
Em
estreita ligação com o Pentágono e a CIA, o Departamento de Estado também
montou a sua própria unidade de propaganda "soft-sell" (civil),
dirigida pela Subsecretária de Estado para Diplomacia Pública e Negócios Públicos,
Charlotte Beers, uma figura poderosa na indústria da publicidade. Trabalhando
em ligação com o Pentágono, Beers foi apontada para chefe da unidade de
propaganda do Departamento de Estado logo após o 11 de Setembro. Seu mandato é
"para atuar contra o anti-americanismo no exterior" [7] . Seu gabinete
no Departamento de Estado destina-se a:
"assegurar
que a diplomacia pública (cativar, informar e influenciar audiências públicas
internacionais) seja praticada em harmonia com os negócios públicos
(estendendo-se a americanos) e com a diplomacia tradicional para promover os
interesses e a segurança dos EUA e proporcionar a base moral para a liderança
americana no Mundo" http://www.state.gov/r/
O
papel da CIA
A
componente mais poderosa da Campanha de Medo e Desinformação (FDI) fica com a
CIA, a qual secretamente subsidia autores, jornalistas e órgãos da imprensa críticos
por meio de uma teia de fundações privadas e organizações de frente
patrocinadas pela CIA. A CIA também influencia o âmbito e a direção de
muitas produções de Hollywood. Desde o 11 de Setembro, um terço das produções
de Hollywood são filmes de guerra. "As estrelas de Hollywood e os autores
de roteiros apressam-se em reforçar a nova mensagem de patriotismo,
aconselhando-se com a CIA e inspirando-se junto aos militares acerca de possíveis
ataques terroristas na vida real". [8] "O Verão de Todos os
Medos" ("The Summer of All Fears") , dirigido por Phil Alden
Robinson, que pinta o cenário de uma guerra nuclear, recebeu o endosso e o
apoio tanto do Pentágono como da CIA. [9]
A
desinformação é rotineiramente "plantada" pelos operacionais da CIA
nas redações do principais diários, revistas e canais de TV. Empresas de relações
públicas externas são frequentemente utilizadas para criar "falsas histórias".
Isso foi cuidadosamente documentado por Chaim Kupferbert em relação aos
acontecimentos do 11 de Setembro: "Uns relativamente poucos correspondentes
bem conectados forneciam os 'furos de reportagem', que obtinham cobertura nas
relativamente escassas fontes de notícias da mídia principal, onde os parâmetros
de debate são ajustados e a "realidade oficial" é consagrada pelos
alimentadores de base na cadeia de notícias". [10]
Iniciativas
de desinformação encoberta, sob os auspícios da CIA, também são canalizadas
através de vários "procuradores" (proxies) de inteligência em
outros países. Desde o 11 de Setembro elas resultaram em disseminação diária
de informação falsa referente a alegados "ataques terroristas". Em
virtualmente todos os casos relatados (na Grã Bretanha, França, Indonésia, Índia,
Filipinas, etc) dizem que os "supostos grupos terroristas" têm
"ligações à Al Caeda de Ussama ben Ladin", sem naturalmente admitir
o fato (amplamente documentado por relatórios de inteligência e documentos
oficiais) de que a Al Caeda foi uma criação da CIA.
A
doutrina da "auto-defesa"
Nessa
conjuntura crítica, nos mêses que antecedem a anunciada invasão do Iraque, a
campanha de propaganda é montada de forma a manter a ilusão de que "a América
está sob ataque". Difundidas não só através da mídia principal como
também de um certo número de sítios alternativos da Internet, essas
"realidades fabricadas" retratam a guerra como um ato de boa fé em
autodefesa, ao mesmo tempo que ocultam os vastos objetivos estratégicos e económicos
da guerra.
Por
sua vez, a campanha de propaganda desenvolve um 'casus belli', "uma
justificação", uma legitimidade política para travar a guerra. A
"realidade oficial" (transmitida prolixamente nos discursos de George
W. Bush) repousa na premissa genérica de que a guerra é "humanitária",
"preventiva" e nomeadamente "defensiva", "uma guerra
para proteger a liberdade":
«Estamos
sob ataque porque amamos a liberdade... E enquanto amarmos a liberdade e os
valorizarmos toda a vida humana, eles irão tentar ferir-nos". [11]
Explicitada
na Estratégia de Segurança Nacional [National Security Strategy (NSS)] , a
doutrina da prevenção através da "guerra defensiva" e da
"guerra ao terrorismo" contra a Al Caeda constituem os dois blocos
essenciais construídos pela campanha de propaganda do Pentágono. O objetivo é
apresentar a "ação militar preventiva" - ou seja, a guerra como um
ato de "autodefesa" contra duas categorias de inimigos, "Estados
vilões" e "terroristas islâmicos":
"A
guerra de alcance global contra terroristas é um empreendimento global de duração
incerta. ...A América atuará contra tais ameaças emergentes antes que elas
estejam plenamente formadas.
.Estados
vilões e terroristas não procuram atacar-nos por meio de meios convencionais.
Eles sabem que tais ataques fracassariam. Em vez disso, eles confiam em atos de
terror e, potencialmente, no uso de armas de destruição em massa (...)
Os
objetivos desses ataques são as nossas forças militares e a nossa população
civil, em violação direta de uma das principais normas do direito da guerra.
Como foi demonstrado pelas perdas do 11 de Setembro de 2001, baixas em massa de
civis constituem o objetivo específico de terroristas e essas perdas seriam
exponencialmente mais severas se terroristas adquirissem e usassem armas de
destruição em massa.
Os
Estados Unidos têm há muito mantido a opção de ações preventivas para
reagir a uma ameaça à nossa segurança nacional. Quanto maior a ameaça, maior
é o risco da inação - e mais instante o motivo para adotar ação antecipada
a fim de nos defendermos, (...) Para impedir ou prevenir tais atos hostis do
nossos adversários, os Estados Unidos, se necessário, atuarão
preventivamente". [12] (National Security Strategy, White House, 2002, http://www.whitehouse.gov/nsc/nss.html
Despejando
desinformação nas cadeias de noticiários
Como
é executada a propaganda de guerra? Dois conjuntos de "declarações"
de "encher os olhos" provenientes de numerosas fontes (incluindo
declarações oficiais da Segurança Nacional, mídia, 'think tanks' com base em
Washington, etc) são despejados diariamente para dentro das cadeias de noticiários.
Alguns dos eventos (incluindo notícias relativas a presumidos terroristas) são
grosseiramente fabricados pelas agências de inteligência. Tais declarações são
baseadas em palavras-chave ("buzzwords") simples e atraentes, as quais
preparam o cenário para a fabricação das notícias.
Palavra
chave nº 1. "A Al Caeda de Ussama ben Ladin" está por trás da maior
parte das histórias referentes à "guerra ao terrorismo", inclusive
"alegados", "futuros", "presumidos" e
"reais" ataques terroristas. O que é raramente mencionado é que esse
inimigo externo da Al Caeda é um "ativo de inteligência" da CIA,
utilizado para operações encobertas.
Palavra
chave nº 2. A declaração de "armas de destruição em massa" [The
"Weapons of Mass Destruction (WMD)"] é utilizada para justificar as
"guerra preventivas" contra os "Estados patrocinadores do
terror", - isto é, países como o Iraque, o Irã e a Coréia do Norte, que
alegadamente possuem WMDs. Como foi amplamente documentado no caso do Iraque,
uma grande parte das notícias sobre WMD e sobre ataques biológicos é
fabricada.
As
declarações acerca de "WMDs" e de "Ussama ben Ladin"
tornam-se parte do debate diário, incorporada à conversas rotineiras do cidadãos.
Repetidas 'ad nauseam', elas penetram no âmago da consciência das pessoas
comuns, moldando suas percepções individuais dos acontecimentos correntes. Por
meio do engano e da manipulação, essa configuração das mentes de populações
inteiras prepara o cenário - sob a fachada de uma democracia em funcionamento -
para a instalação de uma polícia de Estado real. Não é preciso dizer que
essa propaganda enfraquece o movimento anti-guerra.
Por
sua vez, a desinformação referente a alegados "ataques terroristas"
ou "armas de destruição em massa" instila uma atmosfera de medo, a
qual mobiliza um inabalável patriotismo e apoio ao Estado, e aos seus
principais atores políticos e militares.
Repetidas
em virtualmente todos os noticiários nacionais, este enfoque deformado sobre as
WMD-Al Qaeda serve essencialmente como um dogma, para cegar as pessoas acerca
das causas e consequências da guerra de conquista dos Estados Unidos, enquanto
fornece uma simples, inquestionada e autorizada justificação para a
"autodefesa".
Mais
recentemente, tanto em discursos do Presidente Bush como do Primeiro-Ministro
Blair, bem como nos noticiários, as declarações sobre as WMD agora são
cuidadosamente misturadas com declarações sobre Ussama. O Ministro da Defesa
do Reino Unido, Jack Straw, advertiu no princípio de janeiro "que 'regimes
vilões' como o Iraque eram a fonte mais provável de tecnologia WMD para grupos
como a Al-Caeda". [13] Também em janeiro, foi descoberta em Edinburgo uma
suposta célula da Al Caeda "com ligações ao Iraque", a qual estava
alegadamente envolvida com o uso de armas biológicas contra pessoas no Reino
Unido. A agenda escondida das declarações sobre "ligações ao
Iraque" é grosseiramente óbvia. O objetivo é desacreditar o Iraque nos
meses que antecedem a guerra: dos assim chamados "Estados patrocinadores do
terror" diz-se que apoiam Ussama ben Ladin. Reciprocamente, de Ussama
diz-se que colabora com o Iraque na utilização de armas de destruição em
massa.
Nos
últimos meses, vários milhares de notícias publicadas teceram "estórias
WMD-Ussama", dentre as quais alguns trechos são transcritos abaixo:
"Os
céticos argumentarão que as inconsistências não provam que os iraquianos
tenham continuado a desenvolver armas de destruição em massa. Isto também
deixa Washington pendente de outros malditos materiais e acusações, incluindo
a afirmação desta semana, não provada, de que extremistas islâmicao filiados
à Al-Caeda apossaram-se de uma arma química no Iraque no passado mês de
novembro ou no fim de outubro". [14]
A
Coreia do Norte admitiu que mentiu sobre isso e está audaciosamente reativando
seu programa nuclear. O Iraque quase certamente mentiu sobre isso, mas não o
admitirá. Enquanto isso a Al Caeda, embora dispersada, permanece uma força
sombria e ameaçadora e, juntamente com outros grupos terroristas, um receptor
potencial dos arsenais mortais que poderiam emergir do Iraque e da Coreia do
Norte. [15]
O
Primeiro-Ministro britânico Tony Blair listou o Iraque, a Coreia do Norte, o Médio
Oriente e a Al-Caeda entre os problemas "difíceis e perigosos" a
serem enfrentados pela Grã Bretanha no próximo ano. [16]
As
declarações WMD-Ussama são usadas abundantemente pela mídia dominante. Após
o 11 de setembro, essas declarações estilizadas tornaram-se também uma parte
integral do discurso político diário. Elas também permeiam os trabalhos da
diplomacia internacional e o funcionamento das Nações Unidas.
NOTAS
1.
Entrevista com Steve Adubato, Fox News, 26 December 2002.
2.
Air Force Magazine, January 2003, itálicos acrescentados.
3.
Adubato, op. cit. itálicos acrescentados.
4. Ibid, itálicos acrescentados.
5.
Citado em Federation of American Scientists (FAS) Secrecy News,
http://www.fas.org/sgp/news/secrecy/
2002/11/ 112702.html . A entrevista à imprensa de Rumsfeld pode ser consultada
em http://www.fas.org/sgp/
news/2002/11/dod111802.html .
6.
New York Times, 16 December 2002.
7.
Sunday Times, London 5 January 2003.
8.
Ros Davidson, Stars earn their Stripes, The Sunday Herald (Scotland), 11
November 2001).
9.
Ver Samuel Blumenfeld, Le Pentagone et la CIA enrôlent Hollywood, Le Monde, 24
July 2002, http:// www.globalresearch.ca/articles/BLU207A.html
10.
Chaim Kupferberg, The Propaganda Preparation for 9/11, Global Outlook, No. 3,
2003, p. 19, http:// www.globalresearch.ca/articles/KUP206A.html .
11.
Observações do presidente Bush em Trenton, New Jersey, «Welcome Army National
Guard Aviation Support Facility, Trenton, New Jersey », 23 September 2002.
12.
National Security Strategy, White House, 2002, http://www.whitehouse.gov/nsc/nss.html
Autor de 'War and Globalisation, the Truth behind September 11'. Professor de Economia na Universidade de Ottawa e Diretor do Centre for Research on Globalisation - Topo da página